Uma proposta da Igreja Católica de ensinar moral sexual a crianças tratando o homossexualismo como "vício" está causando polêmica na Espanha.
O Arcebispado de Valência elaborou um curso extracurricular - como opção aos cursos oficiais de educação sexual aprovados pelo governo - que será disponibilizado a todas as escolas interessadas.
Esse curso, dirigido a crianças de 5 a 14 anos, apresenta como "vícios" temas como erotismo, pornografia, homossexualidade, masturbação, voyeurismo e obsessão por sexo.
O programa aborda a sexualidade "a partir de uma visão integradora com aspectos biológicos, fisiológicos, psicológicos, sanitários, antropológicos, morais e sociais", disse à BBC Brasil o porta-voz do arcebispado valenciano.
O chamado Programa de Educação Afetivo-Sexual será dividido em três módulos, de acordo com a faixa etária.
As crianças menores de cinco a sete anos de idade, terão aulas sobre precaução contra abusos, heterossexualidade e pudor.
Crianças de oito a 11 anos aprenderão sobre vícios, erotismo e pornografia.
Os maiores, de 12 a 14 anos, vão ter lições sobre o homossexualismo, as famílias convencionais e a castidade até o casamento.
'Referência'
O programa foi apresentado aos colégios diocesanos, dependentes do arcebispado, e instituições religiosas de ensino. Para todos os centros escolares, o programa será oferecido como uma "proposta educativa": não obrigatória porém como "material de referência".
O presidente da Comissão Diocesana de Ensino, Rafael Cerda, disse que muitos centros católicos expressaram interesse em implantar o programa.
O programa também foi oferecido a 300 mil alunos aos bispados das províncias de Valência, Alicante, Mallorca, Menorca e Ibiza.
Organizações de gays criticaram a proposta, acusaram a Igreja de retrógrada e discriminatória e prometeram contestar o plano na Justiça.
"(São) Lições absolutamente fora da realidade que, além do mais, violam a Constituição, pois nos consideram pessoas disfuncionais, portanto serão levadas aos tribunais", disse à BBC Brasil José de Lamo, coordenador-geral da associação Labmda, que representa gays, lésbicas, transexuais e bissexuais espanhóis.
"Não permitiremos que as crenças religiosas discriminatórias sejam colocadas acima dos direitos fundamentais e do respeito. Imagine que há muitas crianças que tem pais homossexuais e querem ensinar nas escolas que estas famílias são patológicas", acrescentou.
Críticas
A queixa da associação Lambda se baseia principalmente no módulo dois do programa católico, que afirma que "a relação entre homossexuais é errônea e estes não devem ser considerados esposos, nem pais".
A Constituição espanhola permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a adoção de crianças por casais gays.
Um dos criadores do método, no entanto, acha que a Igreja apenas defende sua doutrina e tem o direito atender às demandas dos fieis por uma linha de educação para seus filhos coerente com sua crença.
"Tratamos a educação sexual de acordo com nossas convicções, isso é também um direito reconhecido pela Constituição espanhola", disse à BBC Brasil Juan Andrés Taléns, diretor da cátedra de Ciências do Matrimônio e Família do Pontifício Instituto João Paulo 2º, um dos 20 especialistas convocados pelo arcebispado para elaborar o programa.
"Está claro que a política educativa nacional está fracassada. O grande número de abortos, gestações indesejadas e doenças de transmissão sexual são derivados de uma sexualidade inadequada", afirmou.
Nos próximos meses, o programa será estendido a todas as escolas católicas do país como matéria facultativa.
"O problema é que mesmo em colégios católicos, estamos em um país laico, onde a Igreja não é a encarregada de formar sexualmente os alunos", afirmou a presidente da FAPA (Federação de Associações de Pais e Mães de Alunos), Maria José Navarro.
A dirigente disse à BBC Brasil que para elaborar "os conteúdos retrógrados deste programa chamado educativo ninguém contou com a opinião dos pais".
"Esta forma de impor critérios é própria de uma igreja castradora, que nem sequer se questiona se a maioria dos pais quer uma educação de qualidade e respeitosa com todo mundo", afirmou.
Estadão
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